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A história das Tropas Pára-quedistas Portuguesas
“Há que conservar as memórias passadas contra a tirania do tempo e contra o esquecimento dos homens”1 Padre António Vieira (1)
Francis J. Gavin, professor da Johns Hopkins University, no ensaio "What if we are wrong?", na procura da definição de História, cita Marc Block que sublinhara que a mesma não é uma oficina de relojoaria, nem um gabinete de engenharia, mas sim um esforço para melhor compreender algo em constante movimento. Muito recentemente, Miguel Monjardino, periodista e professor universitário, citou também Gavin, que definira História como um discurso em mutação, tecendo depois considerações complementares ao tema. Nas mesmas salientou que, devido a esse movimento, a perspetiva histórica depende muito da geografia e do momento em que a avaliação dos factos é feita, face à contínua evolução do pensamento universal. Por outro lado, se não forem sendo tomados apontamentos sobre os acontecimentos passados, a memória sobre eles resultará difusa e enviesada, podendo mesmo falseá-los. Pelos efeitos que produzem, os verdadeiros motores da História são os detentores do poder político, mas também económico, diplomático, de opinião, etc., de cada Estado ou coligação. Este será tanto mais efetivo quanto mais vincadas forem as chamadas forças profundas, há muito relevadas pelos professores franceses Pierre Renouvin e JeanBaptiste Duroselle (2) . Essas forças são materializadas pela geografia, no seu sentido mais amplo, pelo passado das nações ou suas associações, pelo carácter nacional (consciência coletiva do valor relativo de si mesma), pela língua, pelas religiões professadas, etc. A Instituição Militar é integrada por homens e mulheres que, pelo papel social que lhes está consignado ou, por vezes, por eles e elas assumido, são também motores da História e outras vezes, sobretudo, objeto da mesma. Desta forma, resolvemos publicar esta Cronologia das Tropas Paraquedistas em Portugal, memória sintética dos acontecimentos ocorridos entre 1956 e 2021, que considerámos relevantes no contexto nacional, de modo que não se venha a tornar difusa e até enviesada uma futura avaliação dos mesmos. Procurámos, na sua feitura, afastar a sempre presente subjetividade e indicar a bibliografia consultada, não esquecendo que a História é algo em movimento, quer pela contínua evolução do pensamento humano, quer pela descoberta de novos factos. A Cronologia é apresentada inicialmente por factos que antecederam a criação das Tropas Paraquedistas em Portugal, depois os relativos à criação destas Tropas e o seu desenvolvimento (1955/1975), época em que foram formadas, instruídas e treinadas com o maior rigor e destinadas a combater numa guerra de contrassubversão; seguidamente, face à alteração estratégica decorrente do fim da guerra em África e no período da guerra fria, adequadas afincadamente a esse novo ambiente (1975/2006) e, desde essa data mas já integrados no Exército, capacitadas e empenhadas em operações de apoio à paz e operações de repatriamento de nacionais não combatentes. Em todas essas fases, são bem visíveis os esforços de manutenção do melhor conhecimento e do saber fazer das Tropas Paraquedistas para se equivalerem, no estado da arte, às melhores existentes noutras geografias. Por último, dedicamos esta Cronologia a todos que, como eu, se sentem honrados por terem servido Portugal nas Tropas Paraquedistas, a quem dedicaram todo o seu esforço e saber, honrando o lema da Casa Mãe” Que Nunca Por Vencidos Se Conheçam”.
Oeiras, 1 de dezembro de 2021
Carlos Manuel Chaves Gonçalves MGen (Ref)
1 Vieira, Pe António, Sermão de Nossa Senhora de Penha de França, Lisboa, 1652. Citações e Pensamentos. Lisboa: Ed. Casa das Letras, 2010, p. 69.
2 Renouvin,Pierre, Duroselle, Jean-Baptiste. Introduction a L’Histoire des Relations Internationales.
Paris, Armand Colin, 1970.
(01Jan) Foi criado no Exército Português (Decreto-Lei 27/94, de 05Fev), o Comando das Tropas Aerotransportadas (CTAT) e a Brigada Aerotransportada Independente (BAI), com base nos efetivos especializados em paraquedismo da FAP (1815 Paraquedistas) e do Exército (134, dos quais 68 com o curso de “Comandos“ e mais outros 5, por equivalência do curso de paraquedismo que haviam frequentado noutros países). O CTAT foi constituído herdeiro das tradições e património histórico do extinto Corpo de Tropas Paraquedistas da FAP e também do extinto Regimento de Caçadores Paraquedistas.
(1994) O Corpo de Tropas Aerotransportadas (CTAT) ficou aquartelado em Tancos, na antiga Base Aérea 3, e na sua dependência foi coloca a Escola de Tropas Aerotransportadas (ETAT) criada em Tancos, nas instalações da extinta Base Escola de Tropas Paraquedistas (BETP), e a Área Militar de S. Jacinto (AMSJ), criada em S. Jacinto, no aquartelamento da extinta Base Operacional de Tropas Paraquedistas nº 2 (BOTP 2).
(1994) A BAI foi atribuída ao Allied Rapid Reaction Corp (ARRC) da NATO, sob controlo operacional de uma Divisão de Enquadramento (Framework Division) italiana.
(1995) Na Área Militar de S. Jacinto, AMSJ, foi construída uma área de instrução, visando o combate urbano e o treino de operações de paz, bem como uma torre destinada ao treino de montanhismo.
(1995) Um Batalhão da BAI foi atribuído para participar na operação JOINT ENDEAVOUR da NATO, na Bósnia-Herzegovina (BiH). As Forças Nacionais Destacadas (FND) dos diversos países, deslocadas para o TO e
colocadas sob o controlo operacional do ARRC, constituíram as então designadas Forças de Implementação dos Acordos de Paz (Implementation Forces-IFOR), acordados pelas partes em confronto, em Dayton/USA e, depois, assinados formalmente em Paris. As nossas Forças Nacionais Destacadas (FND) para o exterior de Portugal e integradas em Forças Multinacionais, usualmente são atribuídas ao comando destas na situação de sob controlo operacional, mantendo e não cedendo o EMGFA de Portugal o comando operacional das mesmas.
(05Jan) Previamente à marcha de um Batalhão de Paraquedistas, seguiu para a BiH um Destacamento de Ligação (14 Oficiais e 1 Sargento), destinados a preparar a entrada em posição do Batalhão e, depois, prestarem serviço em diversas estruturas militares no TO, designadamente um Oficial de Ligação no Comando e outros no Estado-Maior da Brigada Multinacional Sarajevo Norte (MNBSN).
(16Jan) O 2ºBIAT/BAI, sob o Comando do Tenente-coronel Moço Ferreira, e um Destacamento de Apoio de Serviços (DAS), primeiro sob o Comando do Tenente-coronel Luís Krug e depois do Major Barbosa, embarcaram para a BiH onde, até 12Ago na situação de sob controlo operacional, integraram a MNBSN, de comando italiano. Esta brigada ocupou a sua Área de Responsabilidade (AOR), dentro da AOR da Divisão Multinacional Sudeste (MNDSE), de comando francês, pertencentes às Forças de Implementação da Paz (IFOR Implementation Forces).
Estas foram levantadas no âmbito da NATO, na sequência dos Acordos de Dayton e para cumprimento da Operação Joint Endeavour. Desde a 1GG (1914/1918), esta foi a primeira e a maior expedição de militares portugueses para o exterior do país, num total aproximado de mil paraquedistas.
(24Jan) Em consequência de um acidente com um artefacto explosivo, que havia sido disseminado por um cluster bomb, o 1º Cabo Mouta e o 1º Cabo Tavares, do DAS e em Sarajevo, constituíram-se como as primeiras baixas mortais portuguesas na BiH.
(1996) O Capitão Álvaro Cunha realizou o Allied Winter Warfare Course, na Escola de Infantaria, em Elverum/Noruega.
(1996) O Tenente Paulo Pereira seguiu para Fort Bragg / EUA, a fim de complementar a sua formação aeroterrestre, com o Curso de Saltador Operacional a Grande Altitude. A BAI continuou assim e, neste âmbito, a manter-se ao nível do estado da arte, fazendo circular cautelar e periodicamente entre os EUA, o Reino Unido e a França alguns dos seus Graduados.
(09Ago / 10Fev97) - O 3°BIAT/BAI, sob o comando do Tenente-coronel Fernando Saraiva, substituiu o 2°BIAT na BiH, com idêntica missão de implementação da paz. Em 21Dez96, face à situação que então se vivia, a missão das Forças Multinacionais no TO foi alterada (Resolução 1088, de 12Dez95, do Conselho de Segurança/ONU), agora para Estabilização da Paz (SFOR - Stabilization Forces).
(06Out) - Na BiH e decorrente de um acidente de viação com uma viatura blindada Chaimite, na qual se deslocavam em patrulha, o 3°BIAT sofreu duas baixas mortais, os Sol Francisco Barradas e Sol Ricardo Souto.
(06Nov) - Foi criada a Força Multinacional Europeia EUROFOR e, na cerimónia de ativação do Comando da Força, em Florença / Itália, participam dois pelotões da BAI.
(10Fev) - Já após o final da missão da IFOR (DEC96) e a sua substituição pela SFOR, o 3ºBIAT regressou a Portugal e foi substituído por um batalhão reduzido da Brigada Mecanizada Independente (BMI).
(14Fev) - Como corolário do trabalho em prol da paz, que havia sido desenvolvido pelo 2º e 3ºBIAT na BiH, o Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio, condecorou o Estandarte Nacional da Brigada Aerotransportada Independente (BAI), com a Medalha de Ouro dos Serviços Distintos.
Documentos fundamentais
- Calheiros, José Alberto de Moura. 2021, “História do Regimento de Caçadores Pára-quedistas”. Vila Nova da Barquinha: União dos Paraquedistas Portugueses (No prelo).
- Grão, Luís António Martinho. 1987. “História do Batalhão de Caçadores Pára-quedistas”. Lisboa: Comando das Tropas Aerotransportadas.
- Grão, Luís António Martinho. 1987. “História do Batalhão de Caçadores Pára-quedistas 12”. Lisboa: Corpo de Tropas Pára-quedistas.
- Lousada, José Manuel Garcia Ramos. 2011“História do Batalhão de Caçadores Pára-quedistas 21”. Tancos: Escola de Tropas Pára-quedistas.
- Martins, Raúl Francóis Ribeiro Carneiro. 1986. “História do Batalhão de Caçadores Pára-quedistas 31”. Lisboa: Corpo de Tropas Pára-quedistas.
- Pires, Orlando Caetano Rodrigues. 1993. “História do Batalhão de Caçadores Pára-quedistas 32”. Lisboa: Corpo de Tropas Pára-quedistas.
- Escola de Tropas Pára-quedistas. 2008. “50 Anos - 1956-2006. Carregueira / Ribatejo: Tipografia e Papelaria Marques.
- O. S. (Ordens de Serviço) do Batalhão de Caçadores Paraquedistas (Tancos, 1956 a 1961)
- O.S. do Regimento de Caçadores Paraquedistas (Tancos, 1961 a 1975).
- O.S. do Batalhão de Caçadores Paraquedistas 21 (Luanda/Angola, 1961 a 1975)
- O.S. do Batalhão de Caçadores Paraquedistas 31 (Beira/Moçambique, 1961 a 1975)
- O.S. do Batalhão de Tropas Paraquedistas 12 (Bissau/Guiné, 1966 a 1974)
- O.S. do Batalhão de Tropas Paraquedistas 32 (Nacala/Moçambique, (1966 a 1974)
- O.S. do Destacamento de Tropas Paraquedistas 1 (Díli/Ataúro/Timor, 1975)
- O.S. do Corpo de Tropas Paraquedistas (Monsanto/Lisboa, 1975 a 1994)
- O.S. da Base Escola de Tropas Paraquedistas (Tancos, 1975 a 1994)
- O.S. da Base Operacional de Tropas Paraquedistas 1 (Monsanto/Lisboa, 1975 a 1991)
- O.S. da Base Operacional de Tropas Paraquedistas 2 (S. Jacinto/Aveiro, 1975 a 1994)
- O.S. do Comando das Tropas Aerotransportadas/Brigada Aerotransportada Independente (Tancos, 1994 a 2006)
- O.S. da Escola de Tropas Aerotransportadas (Tancos, 1994 a 2008)
- O.S. da Área Militar de S: Jacinto (S: Jacinto/Aveiro, 1994 a 2006)
- O.S. do Regimento de Infantaria 15 (Tomar, 1998 a …)
- O.S. da Escola de Tropas Paraquedistas (Tancos, 2008 a 2015)
- O.S. da Brigada de Reação Rápida (Tancos, 2006 a …)
- O.S. do Regimento de Infantaria 10 (S. Jacinto/Aveiro, (2006 a …)
- O.S. do Regimento de Paraquedistas (Tancos, 2015 a …)
- Relatórios de Operações do Batalhão de Caçadores Paraquedistas 21 (Luanda/Angola, 1961 a 1975)
- Relatórios de Operações do Batalhão de Caçadores Paraquedistas 31 (Beira/Moçambique,1961 a 1975)
- Relatórios de Operações do Batalhão de Caçadores Paraquedistas 12 (Bissau/Guiné, 1966 a 1974)
- Relatórios de Operações do Batalhão de Caçadores Paraquedistas 32 (Nacala/Moçambique, 1966 a 1974)
Revistas e jornais militares
- “Kit Bag”, Jornal do BCP 31 (Beira), Jul1971
- “Salta”, Jornal do BCP (Tancos), 28 números, de 1956 a 1958
- “Revista Boina Verde”, BCP 21(Luanda, 113 números, de Ago1965 a 1974)
- “Revista Boina Verde”, RCP/CTP/RParas, do número 119, em Jun75, até ao 258, no 2º semestre 2020.
Livros
- Anacleto-Santos, M., Perestrelo, C., Santos-Correia, J., 2015. “Ao Ritmo do Guia. Memórias de um Curso de Paraquedismo Militar”, Tancos: Pára-Clube Nacional Os Boinas Verdes.
- Barbosa, José da Fonseca. 2018. “Oficiais Milicianos Pára-quedistas da Força Aérea Portuguesa. Vol I os que combateram em África 1955 a 1974”. Porto: Fronteira do Caos Edit. - . 2019. “Oficiais Milicianos Pára-quedistas da Força Aérea Portuguesa. Vol II As Gerações do pós-Império 1975 a 1993”. Lisboa: Manuel Barbosa e Filhos Lda.
- Calheiros, José de Moura. 2010. “A Última Missão”. Porto: Caminhos Romanos. - Cann, John P. 2017. “Os Páras em África (1961 - 1974)”. Cascais: Tribuna da História,
- Chaves, Maximino Cardoso. 2005. “Andanças, Tribulações e Reflexões em Tempo de Guerra”. Coimbra: Edições Minerva.
- Henriques-Mateus, Lourenço Henrique. “1 - Portugal na Aventura de Voar. De Gusmão ao Ocaso dos Balões Esféricos (1709- 1915)”, Printer Portuguesa, junho. 2009, pág. 115-124.
- Machado, M., Carmo, A. 2003. “Tropas Para-quedistas. A História dos Boinas Verdes Portugueses 1955-2003”. Lisboa: Prefácio Editores.
- Mensurado, Joaquim Manuel Trigo Mira. 2002. “Os Páras na Guerra 1961-63 e 1968-72”. Lisboa: Prefácio Ed.
- Mira-Vaz, Nuno. 2019. “Os Pára-quedistas nas Guerras de África 1961-1975”. Lisboa: Sociedade Histórica da Independência de Portugal/Instituto Bartolomeu de Gusmão. - . 2019. “Pára-quedistas em Combate 1961-1975”. Porto: Fronteira do Caos Edit. - Mansilha, J., Mensurado, J., Calheiros, J. et al. 2007. “A Geração do Fim. Infantaria 1954-2004”. Lisboa: Prefácio.
- Moutinho, Carlos Bragança. 1970. “História e Técnicas do Para-quedismo”. Lisboa: Livraria Portugal.
- Serra, Rosa Glória et al. 2014. “Nós, Enfermeiras Paraquedistas”. Porto: Fronteira do Caos Edit.